Semana passada, o senador José Agripino Maia procurou desqualificar a ministra Dilma Roussef por ela ter mentido para torturadores durante a ditadura e recebeu uma resposta maravilhosa. Para quem ainda não entendeu a diferença entre ditadura e democracia, recomendo veementemente que assista o vídeo da resposta de Dilma Roussef.

Lendo a repercussão do caso em outros blogs, acabei por notar uma discussão interessante nos comentários da Mary W, que passava por uma insinuação de que a tortura era legalizada nos tempos da ditadura, da mesma forma que o homicídio de mulheres adúlteras era permitido por ser considerado legítima defesa da honra. Inicialmente, me pareceu uma distorção grosseira de fatos históricos. Depois, analisando a discussão com mais calma, percebi que coisas que pra nós, da área jurídica, são automaticamente enquadradas no contexto histórico adequado, nem sempre o são para leigos. Por isso, acho importante explicar o seguinte:

A tortura não era legalizada durante a ditadura militar, e ainda hoje continua ilegal. O art.322 do Código Penal, vigente desde 1940, proíbe que o funcionário público pratique violência no “exercício de função ou a pretexto de exercê-la”. No entanto, a tortura foi uma prática amplamente utilizada, e endossada pelo Estado, durante a ditadura militar. Embora isso faça parecer que a tortura era legalizada, ela era, e ainda é, uma violação direta da lei. Não vou entrar em detalhes, para não fazer um tratado, mas recomendo a leitura do portal sobre tortura do DHnet para quem quiser compreender melhor a gravidade do tema.

Homicídio, seja de homens ou mulheres, é crime. Está previsto no Código Penal de 1940, art. 121. Explicando de forma simplista, quem mata uma pessoa irá responder a um processo judicial, com um júri decidindo se a pessoa matou ou não, ou, se matou, se existe alguma circunstância que permita a absolvição ou diminuição da pena. Durante a ditadura, os homens que matavam mulheres respondiam ao processo judicial, como qualquer outro acusado de qualquer crime. A diferença é que eles não eram punidos, pois a defesa alegava que eles tinham matado a mulher para “lavar” a honra, maculada por alguma suposta atitude da falecida. Isso não significa que o homicídio de mulheres era legalizado, significa apenas que existia uma desculpa absurda para absolver quem cometia o crime de homicídio.

Curiosamente, os grandes casos de “lavagem da honra com sangue” apareceram em épocas em que as mulheres estavam se organizando para lutar por seus direitos. E infelizmente, a prática de homens matarem mulheres por elas terminarem o relacionamento com eles ou terem relacionamentos paralelos ainda é bastante comum, mas é melhor deixar essa questão pra outro post.