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Minha dívida com a UFMG é gigantesca. Foi lá que passei pelo menos dez anos da minha vida, cinco na graduação, e outros tantos no curso de Formação Musical, durante a adolescência. Aprendi a discutir pontos de vista, a ser tolerante com a visão alheia, a respeitar a diversidade, a pensar e criticar as coisas da forma que nos são postas. Foi o contraponto perfeito a uma família e um colégio extremamente conservadores e autoritários. Todo debate era válido, toda iniciativa para despertar o debate merecia atenção, e ela não vinha exclusivamente dos professores, mas através de iniciativa de alunos (nem sempre ligados ao diretório acadêmico) e até da comunidade externa à UFMG. Viver nessa pluralidade, sem autoritarismo, foi essencial para a minha formação.

Devido a isso, fiquei estarrecida ao receber um e-mail avisando de uma confusão entre Polícia Militar e estudantes no IGC (Instituto de Geociências) da UFMG, que incluiu aparato militar (com direito até a helicóptero), gente presa por desacato e gente espancada indo pro Hospital João XXIII. O assunto é tão grave que virou notícia no Uai.

Pelo que pude entender, os alunos do IGC têm um projeto de cinema comentado às quintas-feiras. O filme escolhido para a última sessão chama-se Grass (em português, Maconha – Grass). Trata-se de um documentário que aborda o processo de criminalização da maconha durante o século XX. No Brasil, foi distribuído pela Editora Abril como conteúdo relacionado à revista Superinteressante. Até aqui nada de mais, apenas um filme sobre um assunto polêmico e que com certeza rende boas discussões.

Porém, a diretoria do IGC não entendeu assim. Pelo que consta no comunicado da Reitoria da UFMG, a diretoria do IGC enviou ofício pedindo reforço da segurança porque o evento não havia sido autorizado pela diretoria, nem era de responsabilidade do diretório acadêmico. Esse ponto me preocupou muito: quer dizer, então, que os eventos na faculdade têm de passar pela censura direta da diretoria? E, mais ainda, só podem ser permitidos se estiverem ligados ao diretório acadêmico? Um grupo de estudos, um cineclube, só são válidos se são ligados à política oficial? Eu já tinha ouvido histórias semelhantes a esta, mas todas ligadas ao período militar.

Ainda de acordo com o comunicado da Reitoria, foi autorizado o aumento da segurança no IGC. Porém, na hora do evento, quem apareceu não foi a segurança interna da UFMG, mas a Polícia Militar, que tentou entrar no prédio. Houve discussão, prisão por desacato (o momento ficou registrado neste vídeo – é o mesmo do início do post), e em seguida, agressões entre PM, estudantes e, ao que parece, até professores indignados com a situação. Alguns alunos precisaram ser atendidos no Hospital João XXIII, por causa dos ferimentos causados pelas agressões. As atividades normais da faculdade foram interrompidas devido ao tumulto. Pelo que li no orkut, a situação foi muito mais grave do que a descrição que estou fazendo aqui.

Fica a dúvida: quem chamou a Polícia Militar, e por quê? Não havia motivo algum para ela estar ali. O policiamento em universidade federal deve ser feito pela polícia federal, e não pela polícia militar (que é estadual) e, mesmo assim, apenas se necessário. Exibir um filme – mesmo com assunto polêmico – não é crime. Além do mais, a UFMG tem esquema próprio de segurança. Essa dúvida parece ser também a da Reitoria, que criou comissão administrativa para apurar a presença da PM no IGC-UFMG.

Espero que cheguem logo a uma conclusão, e tomem providências para que nunca mais ocorra uma situação catastrófica dessas. A UFMG já teve muito orgulho de nunca ter permitido a entrada de militares durante a ditadura. Não faz o menor sentido uma ação dessas em tempos de democracia.