Desde 2006, quando mudei oficialmente o rumo do blog, meu foco é analisar os direitos das mulheres e expor situações sexistas, que dificultam a efetivação da igualdade entre homens e mulheres. Mas tem gente caindo aqui e, sem perceber qual é o meu foco, quer distorcer meus posts pra entrar na guerra anti-Hillary. A esses, vou repetir quantas vezes forem necessárias: estou analisando pura e simplesmente as reações sexistas a Hillary. Não estou analisando a campanha dela, nem sua plataforma eleitoral, nem a relação com os outros candidatos, nem pretendo fazer deste blog mais um dos engajados na campanha presidencial estadunidense. Quem quer ler análises da campanha, discutir cada manifestação e cada vírgula, brigar por causa de méritos ou deméritos das candidaturas, deve procurar outros blogs que estão fazendo a cobertura das eleições.
Fico impressionada com as pessoas que consideram normal a campanha contra Hillary tem um tom sexista. Repetem a velha história: “a sociedade é machista mesmo, e daí?” E daí que, quando as mulheres tentam mudar a sociedade para incluí-las, e ascender ao poder, encontram um bando de hipócritas dizendo que elas têm todas as chances do mundo enquanto, ao mesmo tempo, despejam argumentos sexistas para “provar” que as mulheres não serão boas governantes. Esse discurso não é prejudicial só a Hillary, ele barra toda a ascensão feminina ao poder, legitimando apenas o tradicional “por trás de um grande homem há uma grande mulher” (na sombra!) Não é necessário ser muito inteligente pra saber que esse tipo de recepção afasta as mulheres da esfera política tradicional, pois é muito desgastante e pouco compensador ser julgada primeiro pelo sexo, e depois pelos méritos.
Feministas existem em todos os pontos do espectro político, e estão unidas por um foco em comum: a luta para melhorar a situação das mulheres. Diversidade é uma característica do movimento feminista: as necessidades de uma mulher negra são diferentes das de uma mulher branca, que são diferentes das de uma lésbica, que são diferentes das de uma mãe. Só não percebe isso quem pensa de forma sexista e acredita que as mulheres são um bloco compacto e único, e que uma mulher no poder é o padrão para todas, como se não existissem as diferenças políticas e pessoais. Mas, como se trata de Hillary, é claro que os detratores vão compará-la com Thatcher, apenas porque ambas são mulheres. O reducionismo e o sexismo são tão óbvios, qualquer pessoa com dois neurônios consegue ver isso, que não entendo como só a Mary W postou sobre esse tema. Ou será que sou eu que estou superestimando a capacidade de raciocínio da blogosfera?
Por fim, o clima anti-Hillary é tão forte que, quando aparece alguém pra comentar pró-Hillary, na mesma hora aparece outro alguém para dizer que a situação é parcial, que tem de ouvir o outro lado (o anti-Hillary), numa tentativa de desqualificação de opinião. Quem está agindo assim se esquece que existem milhares de possibilidades de interpretação das posturas políticas, ser pró ou anti são só duas delas (e, pra complicar, todas podem estar certas!)
Mas o mais preocupante é que essa obsessão por mostrar os dois lados é extremamente parcial: a mídia é sexista, e faz campanha contra mulheres. Quando alguém vem mostrar os pontos de vista feministas, e outras pessoas insistem em ouvir o outro lado, o que estão fazendo é obrigar uma minoria oprimida a divulgar o discurso que a oprime. Se ainda estivéssemos em uma campanha anti-escravidão, vocês obrigariam os abolicionistas a divulgarem o outro lado, que implicaria em fazer algum discurso escravocrata? Não, né? Então, por que exigir que as mulheres, que têm pouco espaço para discutir suas questões, devam separar parte desse espaço para divulgar o discurso sexista? Que tal inverter a situação e cobrar que a mídia tradicional mostre “o outro lado”, ou seja, o ponto de vista das mulheres que são oprimidas por esse discurso sexista? Seria muito mais justo e lógico.
Um aviso: não estou comentando genericamente os comentários dos posts anteriores. Estou falando do que tenho visto na blogosfera. Creio que é possível transcender o nível pessoal dos comentários e ver uma tendência de pensamento geral. Infelizmente, constato que ele é sexista, e poucos e poucas se dão conta disso
Cynthia, quando você diz que “só” deseja analisar os “ataques machistas, sexistas a Hillary”, você separa coisas que sempre estiveram juntas: sexo, sexualidade, diferença de gêneros e política. Por isso talvez apareceram as “pessoas de pára-quedas” no seu blog. ;-)) Bem, eu caí “por terra” mesmo, porque já leio faz tempo seu blog. Você disse no “ps” que não está analisando comentários, mas seu texto é todo baseado na caixa de comentários de seus outros posts.
Quando aparece alguém elogiando “um outro lado da questão”, essa pessoa não está sendo “anti ou pró Hillary”. Ela está analisando todas as partes do todo igualzinho a você. Exemplo: leu um artigo e gostou também e isso não é oprimir mais e mais a sua fala e do restante das mulheres que pensam como você e tão menos achacar o discurso de quem “observa o sexismo nos ataques a candidata à presidência dos EUA”. Como você mesma disse, há outros pontos de vista dentro de outros de pontos de vista. E muito pelo contrário, isso tudo é fruto da “imparcialidade” e da democracia que existem no mundo, das diferenças entre as experiências pessoais de cada um, e não “parcial” a que você se referiu.
Concordo com o último parágrafo do seu texto, que evidencia a questão do “entregar o ouro ao bandido”, mas o fato de aparecer imediatamente um “outro lado” não significa mesmo que haja uma barreira impedindo os “oprimidos” de continuarem a reclamar sobre a opressão que sofrem.
Inté! 😉
Aliás, achei que você que está enxergando o mundo sob uma lente “noir et blanc”.
Cynthia, só não entendo como você pode pretender analisar “pura e simplesmente as reações sexistas a Hillary” sem levar em conta quem ela é e no que ela está envolvida. Essas reações têm de ter sua origem e o seu alvo explicitados e virados do avesso até para que você consiga detectar onde há, de fato, sexismo. A não ser que você acredite que tudo, em todos os momentos, que surja contra toda e qualquer mulher seja sempre sexismo (ou unicamente explicável por ele). Mas aí, vamos combinar, sua intenção de análise já nasce abortada por uma agenda pré-moldada e impenetrável. Isso sim é que é, “pura e simplesmente”, reducionismo.
o que me parece evidente é uma vontade de retroceder no debate. como se ainda tivéssemos que pontuar as discriminações que foram bandeira do movimento nas decadas de 60/70. Pra mim é um travamento quase deliberado. E a inversao é intencional. As sexistas somos nós porque enxergamos sexismo em tudo. E há ainda o modismo. Eu noto que é “super descolado” trombetear que vota/apóia independente de genero ou etnia. Pra em seguida fazer afirmaçoes preconceituosas a respeito do “nao” à hillary. Que preguiça de burrice.
Utz!
Não, Gi, eu fui muito além dos comentários daqui.
Cleber, do jeito que você fala, até parece que a Hillary merece ataques de cunho sexista por ser ela quem é e por ter a trajetória que ela tem.
mary w, você resumiu tudo perfeitamente.
Cynthia, eu realmente não disse nada perto disso. Só acho óbvio que ela, por conta da sua exposição e trajetória, já está de saída mais vulnerável aos ataques típicos do jogo político do que alguém que esteja praticamente entrando em cena agora. E, por ser mulher, mais sujeita a que alguns desses ataques tenham cunho sexista. Eu não trabalharia na campanha dela me precavendo contra ataques ao fato dela ser branca ou protestante, por exemplo. Não acredito que você discorde disso. Caso contrário, adoraria saber pontualmente por quê.
Mas por favor me responda: você vê por aí, ou se ainda não viu acha que pode haver, alguma crítica de cunho não-sexista a Hillary?
Cynthia, com certeza você foi além, mas pegando o “fio da meada” a partir dos comentários discordantes a seu texto. E isso enriquece o debate.
Cleber, como eu falei no início, sei que existem muitas críticas não-sexistas a Hillary, mas não estou acompanhando as prévias em detalhes. Meu objetivo aqui é desmascarar o sexismo, até porque ele não é exclusividade dos Estados Unidos. Ninguém trabalharia na campanha da Hillary se precavendo contra ataques por ela ser protestante ou branca porque esses são valores já solidificados e tratados como normais na sociedade estadunidense. Mas uma mulher ser candidata a presidente é anormal e um desaforo, como já disse o nosso querido presidente…