Dois absurdos envolvendo homossexualidade foram notícia nas últimas semanas: um é a sentença homofóbica do juiz do caso Richarlyson, outro é um texto do João Pereira Coutinho que circulou por e-mail, recebendo elogios.
Vi muita gente criticando o Richarlyson por ter processado o dirigente do Palmeiras, quandor este insinuou que o jogador é homossexual. Quem critica afirma que ser homossexual não é demérito, no que eu concordo plenamente. Só que isso não implica em obrigar as pessoas a se declararem como homossexuais ou heterossexuais, ou terem sua orientação sexual divulgada sem autorização. Como se trata de uma situação em que só a pessoa pode decidir se divulgará ou não sua orientação sexual, se houver uma atribuição de orientação sexual não autorizada, ela pode trazer prejuízos para a pessoa, cabendo processo judicial para sua reparação. Os Estados Unidos vão na contramão desse entendimento, obrigando passageiros de vôos transatlânticos a declararem sua orientação sexual, entre outros dados pessoais.
Explicado porque o Richarlyson pode processar o diretor do Palmeiras, vamos para o show de horror que foi a sentença que determinou o arquivamento do caso. O juiz, ao invés de se limitar ao processo, resolveu falar demais… insinuou que era caso para ser resolvido entre as partes, tête-a-tête e afirmou que: futebol é jogo viril, varonil (como se um homossexual não pudesse ser viril, varonil, etc); não pode conceber ídolos do futebol como homossexuais; se homossexuais querem jogar, devem criar uma federação própria; se virar moda, os clubes terão sistema de cotas; também o negro, se homossexual, deve evitar jogar futebol com heterossexuais; homossexuais não podem ser admitidos no futebol porque atrapalhariam o entrosamento e equilíbrio da equipe; falou ainda do desconforto do torcedor que vai ao estádio com o filho e fica analisando o atleta com “evidente problema de personalidade, ou existencial” (sic). Não estou brincando, tudo isso está na sentença, leiam a íntegra dela.
É difícil até criticar, tantos são os absurdos. A homofobia está bem evidente, e fico aliviada por ver tanta gente contrária à sentença. Mas também fico receosa, pois sei que no judiciário há muito mais gente com essa mentalidade preconceituosa. Como o caso teve uma grande repercussão, o repúdio à sentença serve para mostrar a quem tem preconceito que é pra arejar as idéias, ou se calar antes de passar mais vergonha.
O outro assunto polêmico é o artigo de João Pereira Coutinho, intitulado “Não existem homossexuais”. Ele afirma que não existem homossexuais, e o que interessa é o gênero humano. Não pretendo fazer um artigo criticando-o, mas explicar um dos motivos pelos quais não gostei do que li: ele defende, nas entrelinhas, um cala-boca às minorias políticas. A mensagem do texto é: “Somos todos iguais. Então, celebremos nossa igualdade, e ignoremos a diversidade”. Esse discurso fala de um padrão de igualdade masculino, branco, heterossexual, europeu (que é o perfil do próprio autor). Quem não se identifica com esse padrão (homossexual, mulher, negr@, indígena, criança, não é europeizad@, etc), deve se esforçar para se igualar ao padrão de igualdade, sem questionar se sua realidade vai se adaptar a ele.
A força das minorias está em publicizar o espaço privado, reconhecendo diferenças e exigindo respeito e visibilidade a elas por serem parte de uma identidade, de um grupo, que tem tanto direito de existir e ser respeitado quanto qualquer outro. Porém, a acreditar no que afirma o artigo, identidade se torna um rótulo depreciativo, que a pessoa precisa se livrar (ou manter invisível) o mais rápido possível, para chegar ao ideal de ser humano masculino branco heterossexual europeu. Isso, pra mim, é um retrocesso nas possibilidades de existência humana, e vai contra a maior parte das teorias jurídicas recentes, que são voltadas para a o respeito à diversidade e inclusão social das minorias políticas.
É uma pena que as pessoas que elogiaram o artigo preferem ignorar as conquistas de seu grupo, achando melhor serem incluídas em um padrão que as levará para a invisibilidade social, e que continuará trazendo prejuízos em caso de uma declaração de orientação sexual. Creio que não faz sentido esconder nossas diferenças, e que o mais lógico é continuar a luta para que todo tipo de identidade e orientação sexual sejam tão respeitadas quanto o padrão masculino branco heterossexual europeu que vige atualmente.
Antes de tudo penso que você está certa ao classificar o Sr. Coutinho como “masculino branco heterossexual europeu”. Mas está errada ao dar tamanha importância a este grupo.
Não que eles não exerçam sua função de elite do mundo, mas o fato é que sempre existiram dominantes e dominados, desde que o homem é homem (ops, quis dizer humanidade, viu?). O fato é que os “dominados” mais perspicazes e maleáveis sempre conseguiraram se sair bem no meio dos “dominantes”, sem terem que fazer de sua condição, qualquer que seja, um motivo de balbúrdia, ou pior, “orgulho” (como bem salienta o Sr. Coutinho, não faz o menor sentido sentir orgulho por algo que não se mereceu).
E os que não conseguem tem que recorrer ao único recurso que lhes resta: o grito. Nada contra, cada um se vira como pode. Mas penso que numa sociedade realmente civilizada não seria preciso amparo jurídico para incluir as minorias, sejam quais forem. Mas, pelo vista, ainda estamos muito longe disso. Se é que um dia alcançaremos esse ideal…
Discordo completamente, Lionheart. Numa sociedade realmente civilizada, as minorias estão incluídas tanto nas leis quanto na aplicação delas. Não precisam viver em um sistema de resistência contínua (que você interpretou como “se sair bem no meio dos dominantes”, e “balbúrdia”), pois têm direitos garantidos e efetivados na prática social.
O que você está defendendo é uma manutenção de um sistema em que dominadores continuam dominando, e dominados não têm direitos e se calam – na verdade, resistem. E resistir a ser enquadrado em um sistema que impõe apenas uma identidade altamente excludente é motivo de orgulho, sim.
Cynthia, gostei muito deste post seu. Eu li o que o moço escreveu e fiquei com um certo mal estar que não conseguia muito nomear, mas era isso, uma sensação de que era mesmo um chamado à ignorar as diversidades. E a sentença desse juiz eu achei, ou melhor eu me senti envergonhada de ser da classe. Abraços.
Incrível.
Deixa eu recuperar o fôlego. Incrível mesmo. Eu tinha lido sobre esse caso meio que na diagonal e não tinha notado esses detalhes todos. É um absurdo sem tamanho. E o pior é ver que as pessoas usam uma espécie de versão light, “amigável” , do preconceito e vêm com tentativa vazias de apaziguar com tiradas como: “qual é o problema?”, “e daí?” e “é assim mesmo”.
A sentença é uma vergonha. Simples assim.
Quando recebi o texto do Coutinho por e-mail achei bonitinho, meio utópico, e pelo que sei muitos homossexuais gostaram do texto, outros nem tanto… Recentemente o Ministro Marco Aurélio escreveu um a respeito do mesmo tema, e a ficha caiu, se homossexuais não existem pq eu não posso beijar a minha namo em público sem nenhum velho babão ficar olhando? pq nós homossexuais somos na maioria das vezes mais preconceituosos em relação a nós do que alguns heteros? pq que nós homossexuais temos que ficar restritos a “centros de convivência” (cine, boate, bares GLS) homo?
JOÃO PEREIRA COLTINHO,
EU SOU HOMOSSEXUAL!
Achei interessante a ótica dele, Pelo que entendi ele levanta e derruba rsrsrsrrsrsrsrs.
Uma vez minha sobrinha chegando da escola, passou por mim silenciosa, o que estranhei. Não era de costume, não me falou como foi sua aula nem me deu aquele tradicional beijo sujo de chocolate ou outra guloseima como sempre faz. Convocando sua presença linda imediatamente para satisfações ela se aproxima pensativa e me atira: – Titio, eu sou neguinha? Ela nunca tinha se preocupado com isso, seu pai é negro, sua mãe, minha irmã, é branca. Ela, minha sobrinha, é mulata apesar de prevalecer a cor branca, nela, é essa a classificação biológica. E continuou – meus coleguinhas me xingaram de neguinha( fazendo bico de choro) srsrsrsrsrsr! Prontamente disse-lhe que era neguinha sim!!! E linda! Coloquei que ninguém nunca havia problematizado isso em casa!! Que amávamos ela assim justamente com aquele cabelo, com aqueles lábios grossinhos lindos!! Que essa diferença na casa era muito legal! E que quando a chamassem assim, ela não revidasse mas pensasse sempre que ela não depende da opinião deles mas de quem a ama e quem a ama prefere ela neguinha!!! Falei da natureza multicor da vida, dos negros atletas, artistas, cantores, da diversidade linda das etnias e da preponderância do folclore africano no mundo todo com a música, a dança, as artes, da importância do negro na formação do progresso para o mudo todo na Europa e América coloniais, das quais guardávamos descendência, a se expressar nela própria, até nossos dias. Beijei-a sorridente e confiante e transformei o que era defeito em qualidade com muito amor. O que foi bastante pra ela se interessar pela conscientização e aceitação de sua condição natural. Não a lisonjeei com pieguismo protetor, falei a verdade!
Quando não somos suficientemente adultos, Toda auto-estima primeiramente é construída de resistência a forças que nos oprime, e o orgulho impulsiona-nos o valor. Analisemos uma pessoa que foi muito oprimida, desprezada, vítima de críticas(pior ainda, infundadas), crescera comprometida na sua dignidade, certamente isso se expressará evidentemente no seu perfil inseguro, culpado, angustiado propenso a insatisfação e agressividade. E como resposta, inconscientemente, reunir-se-á em grupo, onde possa se sentir confortável e aceita!!! Gandy era hindu, advogado, aristocrata educado nos finos moldes ingleses, mas “desceu do salto” e uniu-se ao seu povo oprimido, maltratado sem auto-estima, embrutecido pelo primitivismo de sua cultura, e o aviltamento do oportunismo imperialista inglês. E ele se entregou a causa. Se lhe perguntasse se lutava pelos hindus ele dizia que não, lutava pela humanidade, pelos hindus, mulçumanos, ingleses, cristãos, por que ele lutava pelo que todo ser humano quer e tem direito: liberdade!! mas ele dava seu grito a partir do seu povo, reunindo o seu povo, valorizando o seu povo! E em sua independência, viu a forma de reverter tanta subserviência e medo e a oportunidade de dar exemplo a outras nações… Ele era universal como sugere o texto do colega, mas a partir de sua condição, de sua causa!!. Sei das proporções, peculiaridades e diferenças das causas: a hindu e a homossexual, mas também sei que o fundo de liberdade de respeito de luta que se quer e se tem direito é o mesmíssimo para as duas, ou todas as causas! Nosso momento histórico é outro e as telecomunicações expandem a proporções universais os eventos restritos a GUETOS IDEOLÓGICOS DE PATRULHAS. Pergunto pra ele o que é “gueto” quando o assunto agora é tão admitido, até por quem não é gay, e publicamente generalizado! Ao contrário, todos agora mostram suas diferenças com respeito, todas as tribos mostram suas artes. Existe sim a arte negra!!! Existe sim a arte egípcia, a tapeçaria hindu inigualável! Existe sim a arte rupestre, a música negra dos guetos norte americanos, o blues, o jazz, o rap e sua tribo. Tenho satisfação imensa de ter Pelé, Daiane dos santos, Zezé Mota, Castro Alvez, Miles Daves, James Brow, Marte Luter king, Danzel Washington, Gilberto Gil, negros maravilhosos e lindos personificando virtudes que quero que minha sobrinha tenha. E vou lembrar de Miguelangelo, Leonardo da Vince, Van Gog, Frida Callo, Elton Jhon, Oscar Wild ,Zeca Balero, Zélia Duncan, Rimbau, Marving Gaye, Casssia Eller, Ana Carolina, Milton Nascimento, Renato Russo, Baldeleire, Fagner, Ney Matogrosso, Vera Verão, etc. se for o caso da minha sobrinha também ser lésbica.
Não só existe um gênero homossexual não, como sugere o colega, João Pereira e sim “gêneros”: travestis, bichas, frangos, barbyes, gay, transformistas, passivos, ativos, veados, discretos, enrustidos, declarados, bombados em todos os setores de atividades, credo, classe social, cor etc talentosos, inteligentes, com medo de se expor, humilhados eclipsados irreconhecidos pelo veneno invejoso das “verdades” heterossexistas de uma cultura ruindo em pedaços de tanta imoralidade generalizada independentemente de sexualidade.
Se eu entendi o texto do colega, acho que ele foi infeliz no comentário, 1º, ele não está na pele de um homossexual, nem na de um negro( literalmente ) rsrsrsrsrsrrsrs 2º ninguém resumi a um gênero ou categoria algo universal que é passível de entendimento por qualquer alma humana e isso não precisa de paladinos defensores por que é evidente por si só. O que se quer é diminuir, suavizar a nossa cultura da barbárie do preconceito, isso sim qualquer idiota percebe, enquanto outros idiotas formulam tratados filosóficos sobre gueto filosóficos de não sei o que lá!!! Srsrsrsrsrsrsrsrs E até eu que sou intelectual de “machado de Assis e José de Alencar” (lembra do ginásio? rsrssrsrrsrsrs) sei disso!!!!!!!!!!
Na lógica dele, ele dá a idéia de que nós homossexuais não deveríamos tá lutando por nada, porque tudo já nos cabe por direito simplesmente por já sermos seres humanos, e que o que queremos é pavonear, exibicionismo. Essa idéia é perigosa porque isso aqui não é o pais das maravilhas! Não elevamos o sexo a condição “identitária”, por si só o sexo nos cataloga, nos contextualiza, a herotização de um gesto afeminado, ou um simples carinho entre dois homens ou duas mulheres é imediata na visão do heterossexista, nos risinhos cínicos, nos rotulando preconceituosa imediatamente, daí não podermos expandir afeto em público, não podermos nos expressar, sobre pena de sermos expulsos de bares, shoppings, etc. e nós é que invertemos, quando nos personificam pelo falo!??. Esses “prêmios” na “categoria gay” que o colega coloca é simplesmente o esforço de poucos grupos solidários contribuírem com uma “causa” de responsabilidade social bem mais profunda e é evidente, como ele próprio dá a idéia em seu texto, que estariam longe de por si só sanarem os problemas enfrentados pela homossexulidade, e onde!!!? trofeuzinhos, filmes premiados, exposição em mídia, chancezinhas de se expor, que daqui a pouco cai em esquecimento como a própria arte comercial cai em desuso, se trata de um domínio ideológico em expansão e patrulhamento do que quer que seja, ou de fazerem os homossexuais se imporem dominantemente com “sua arte”!! É subestimar demais e nivelar por baixo demais o que nós homossexuais esperamos de um mundo melhor! Mas, já são posturas que levam a discussão, e conseqüentemente a um mundo melhor onde adjetivo não tenha que virar substantivo.E vejo bem mais benefícios nisso que malefícios. É claro que existem pavoneamentos, lantejoulas, ufanismo, exclusivismo, oportunismo, também! Como na política, na religião, nas ONGs com suas “funções sociais”, no jornalismo, em tudo. Enquanto a humanidade não nos conferir respeito e direitos temos que lutar por ele, suavizando para outras gerações a nossa cultura tão dura, onde somos ridicularizados e desprezados por policiais numa delegacia quando num momento de desconforto e dor, frágeis, estamos prestando queixa de um assalto( aconteceu comigo!), ou desprivilegiados num emprego quando temos capacidade, etc. Admiro-lhe a inteligência e a cultura no texto, apesar de acha-lo sofismatico. O colega tem todo o direito de expressar, também, suas idéias. Seria um contra-senso meu se depois de tudo o que falo sobre liberdade não reconhecer-lhe o mérito com respeito. Mas Digo-lhe com carinho: temos que ter muito cuidado pois somos formadores de opiniões e o momento é aquele em que se não atrapalhamos já estamos ajudando muito. Já há quem nos empurre pra trás! rsrsrsrsrsrsrs A igreja que ao invés de cumprir seu papel cristão cai matando com seu moralismo retrogrado estratégico de condução popular, a falta de políticas públicas que nos pré veja como seres humanos existentes, a justiça e a constituição engessadas numa cultura machista, heterossexista e homofóbica, etc. São vidas em jogo! De crianças e adolescentes descontextualizados da escola, por extensão prostituição e marginalização por inadequação ao mercado de trabalho e inaceitação social, suicídios( pensei muito nisso), desprezo famíliar, pais de famílias gays de vida dupla, DSTs, e tanto pior a situação quanto mais baixa a renda familiar e o grau de escolaridade. Será que esses guetos onde choramos silenciosamente são mais aceitáveis pelo colega??? O colega foi muito simplista!!!!
Talvez o medo do colega seja, que como uma peste, a homossexualidade ataque o filho dele. Ou então que no boom da “diversidade” tão em moda, ele se veja obrigado a rever seus conceitos e a sair do armário, coisa que não é fácil quando em tempos de império machista, e agora ao contrário possa ser arrastado pela correnteza srsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsr.
Sou homossexual assumido meu gueto ideológico de militância é o amor, a partir de minha condição oprimida, a partir do meu sofrimento e dos outros que vejo e com quem convivo, a partir do meu gênero, a partir do que sou, e não impondo a ninguém o que deva ser, mas que sejam o que quiserem ser com muita liberdade, paz respeito seja em filmes gays, estatuária gay, galerias gays ,se isso significa “guetificar” se isso significa orgulho, se isso significa escândalo, se isso significa reduzir à genitália toda a expressão de um vida “Viva ao pênis que escandaliza e liberta!!”(rsrsrsrsrsrsrsrsr) com discussão justa e honesta quebrando as vitrines sujas desse shopinggcenterzinho fechado, retrógrado, moralista hipócrita de meia dúzias de pseudo intelectuais burgueses e boçais trabalhando contra o progresso fingindo estar ao seu favor. Queremos mais práticas, que teorias, queremos viver quem somos!Viva aos índios! viva aos hindus! aos negros! Aos gregos! Ao baianos!As mulheres! Aos sem terra! A todos os seres humanos e VIVA A BICHA LOUCA!!!
Ricardo Souto, 38, músico, tec. de arquitetura ricosouto@gmail.com militante no movimento gay leões do norte
…e dizem que concurso pra Juiz é difícil. O que seria de nós se fosse fácil? Fico boba de ver como há tanto magistrado despreparado! :/