Em Abaetetuba, no Pará, uma adolescente acusada de furto foi colocada por um mês em uma cela com 20 homens. Ela precisou manter relações sexuais com eles em troca de comida, além de apresentar hematomas e queimaduras de cigarro. Os responsáveis pela prisão não informaram ao Judiciário que ela dividia a cela com homens por falta de ala feminina. Segundo a atualização da Folha, essa informação constava no ofício. Pela foto no site da Folha, não é possível ter certeza, já que não apresenta o nome da presa, nem é possível ver a data do ofício. Fica a dúvida.

Como se não bastasse, a polícia do Pará confirmou hoje que uma mulher ficou presa por dois meses em uma cela com 70 homens.

Se não têm ala feminina, que liberem as mulheres, ou providenciem imediatamente a transferência para um local adequado. O que não pode é o Estado violar os direitos das mulheres ao colocá-las em um local no qual podem sofrer abusos dos mais diversos tipos, e seus agentes, ao invés de zelarem pela integridade das presas e dos presos, fazerem de conta que não estão percebendo a situação desfavorável das mulheres.

Atualização em 25/11:

A essa altura, já temos o terceiro e quarto casos de mulheres presas na mesma cela que os homens, no Pará.

Porém, a indignação está indo para o lado errado no caso da adolescente. Muita gente está furiosa porque foi uma delegada de plantão (21 de outubro foi um domingo) que prendeu a menina, e foi uma juíza que não autorizou a transferência. O próprio ministro da Justiça acredita que o fato dela ter sido presa por mulheres é pior. Isso esconde um problema de gênero, como se uma falta feminina fosse mais grave que uma falta masculina. Pra vocês terem um parâmetro, exceto nos casos de violência sexual (mas não vou falar disso agora), ninguém diz que é mais grave um homem cometer um crime contra outro homem.

Durante um mês a adolescente ficou em uma cela com homens, sendo abusada por eles enquanto era vigiada por diversos policiais provavelmente homens (ninguém falou do sexo deles ainda), e com um delegado que acredita que ela não sofreu abuso sexual. Por que nenhum desses nobres senhores tomou providências para tirá-la de lá imediatamente? O próprio pedido de transferência foi feito mais de duas semanas depois da prisão ilegal. E, se vocês lerem esta entrevista feita com a adolescente (link via Pedro Dória) vão descobrir que os presos usavam preservativos. Quem fazia vistas grossas e fornecia preservativos a eles? Por que, então, vamos ficar jogando pedras nas mulheres, e esquecendo que, no restante do mês, a adolescente estava à mercê dos homens?

O caso já conta com três pessoas afastadas do cargo, sendo que só uma delas é mulher. Os homens foram convenientemente esquecidos. Segundo a Folha:

Foram afastados, por período indeterminado, a delegada plantonista responsável pelo flagrante, Flávia Verônica; o delegado titular da Delegacia de Polícia de Abaetetuba, Celso Viana; e o superintendente da Polícia Civil na região, Fernando Cunha.

Não me entendam mal, não quero livrar a cara da delegada e da juíza. Mas dividir a culpa como se as mulheres fossem piores só esconde a cara dos homens, que são tão culpados quanto. Todos nessa história estão errados, tanto que o pai da menina sofreu ameaças para alterar a idade da filha, e os presos que estavam com ela na cela foram transferidos. Hoje só há um rapaz na cadeia, mas ele só entrou lá depois que a adolescente saiu.

Vamos colocar as coisas nos seus devidos lugares: esses casos são reprováveis porque obrigam mulheres a dividir cela com homens. Isso chega ao absurdo quando violam o Estatuto da Criança e do Adolescente e colocam uma adolescente na cela. Quem patrocinou qualquer uma dessas atrocidades tem de ser punido. Não importa se foi homem ou mulher. Mas que a culpa seja distribuída igualmente entre todos os que colaboraram para que a situação ocorresse.