As perguntas que mais ouvi nas duas últimas semanas foram: o que é e pra quê serve a Campus Party.
É difícil explicar “o que é”, pois são tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo, que não há como definir um conceito. Talvez a definição mais ampla seja a melhor: um evento para fanáticos por tecnologia no qual cada um leva seu equipamento favorito. E como existem milhões de possibilidades de se usar a tecnologia, temos milhões de possibilidades de tornar o evento único para cada pessoa.
Pra quem está habituado a congressos acadêmicos, a lógica é bem semelhante: em áreas de atuação específicas existe uma programação pré-definida, com palestras e oficinas. São diversas áreas, com atividades simultâneas, e cada pessoa deve escolher fazer o que mais lhe agrada. Há uma certa previsibilidade, já que as atividades refletem os interesses dos coordenadores de área. Porém, como nos congressos mais interessantes, há espaço para diálogo entre os participantes, apresentação de trabalhos, questionamentos. Assim, o evento que poderia ser razoável por causa de uma ou outra palestra relativamente previsível se torna fantástico porque houve algo que fugiu da programação, conheceu uma pessoa diferente, teve um debate inovador… e o que era previsível vira um festival de surpresas.
E pra quê serve um evento desses? Vou falar por mim, já que cada pessoa tem uma noção de “utilidade” diferente: usei o evento pra conhecer outras pessoas, reencontrar amigos e amigas, repensar minha relação com tecnologia, ter ideias, participar de discussões interessantes (como a de internet e pornografia, a do universo feminino, e o desenvolvimento do Partido Pirata), observar pessoas e situações, aprender a viver em um ambiente diferente. Voltei pra casa fascinada com robótica, disposta a aprender astronomia e retomar os estudos de direito informático, louca de vontade de jogar mais, e pensando em vários projetos que quero desenvolver ao longo do ano… tenho a impressão que recuperei um pouco da minha porção nerd que foi sufocada pelo mestrado.
Mas não sei se com todo mundo aconteceu essa explosão de criatividade… a impressão que eu tive é que as pessoas não estão preparadas para isso: querem viver com um quadro fixo de programação, sem entender que o divertido é a maleabilidade. Depois reclamam quando as palestras não atendem às expectativas e por isso o evento é chato – mas quem é o louco que vai pra um evento gigantesco (mais de 6 mil pessoas convivem durante quase 7 dias!) e acha que ele se resume a levantar plaquinha de nota 0 a 10 pra uma dúzia de palestras de uma área específica? Tem tanta coisa acontecendo em volta que ficar preso à programação oficial é miopia…
Parte da graça da Campus Party é o acampamento: não só porque é divertido acampar (e, pra minha sorte, eu sempre encontrei chuveiro com água quente e banheiros limpos), mas porque é na convivência durante a madrugada que acontecem as coisas mais divertidas, que se desenvolve a cumplicidade e se aproveita a liberdade. Teve gente que me falou que gosta da Campus Party porque pode passar dias no computador, e ninguém vai reclamar que está na hora de dormir ou que já passou da hora de ir fazer outra coisa. Tive de concordar…
Claro que nem tudo foram flores: a poluição sonora foi terrível (som falhando apenas nas palestras; no resto do tempo, o barulho era ensurdecedor – algodão no ouvido era fundamental pra conseguir dormir), a alimentação estava péssima, as atrações culturais foram mal escolhidas, a segurança estava bastante falha. Meu cérebro pervertido imaginou pelo menos uns 10 esquemas diferentes pra burlar a segurança e fazer coleção de notebooks – nenhum colocado em prática – e tenho certeza que não estou sozinha, basta ter um neurônio pra saber o quanto estava tudo desprotegido. A divulgação da programação deixou a desejar, era uma aventura descobrir o que estava acontecendo nas outras áreas – a interdisciplinariedade ficou prejudicada, sendo que deveria ser a tônica do evento. As áreas Campus Verde e Inclusão Digital ficaram isoladas num cantinho fora da área nobre. O questionário de satisfação com o evento era gigantesco e ridículo, com aberrações do tipo “quem é o chefe da família”. E cortaram a verba da área de astronomia no Ano Internacional da Astronomia, tem cabimento uma coisa dessas?
Não fiz nem metade do que eu queria, não conversei com todas as pessoas que gostaria, mas mesmo assim foi muito bom. Se puder, ano que vem estarei lá de novo.
Eu também estarei lá ano que vem. E por mais dias!
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Beijos!
Ana Cláudia, da próxima vez a gente tem de conversar, viu?
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