Dia 28 de setembro é o Dia de Luta pela Descriminalização do Aborto na América Latina e Caribe. Trata-se de uma data para lembrar que as mulheres ainda são consideradas menos cidadãs que os homens, sofrendo interferência sobre seus corpos e sua saúde.

Prosseguir ou interromper uma gravidez é algo que só diz respeito à mulher. Por mais que o homem contribua na concepção (e crie teorias que o valorizam como procriador), quem suporta toda a gravidez, quem passa pelo processo de parto, quem cria a criança praticamente sozinha e quem é responsável por ela é a mulher. É ela quem sabe o quanto terá de abdicar de sua vida para poder ter e criar a criança. É ela quem tem de decidir se e quando quer ter filhos. Estado, família e amigos dela devem apoiá-la e respeitá-la em sua decisão, permitindo meios dignos tanto para a continuidade quanto para a interrupção da gravidez.

Muitas pessoas não concordam com o direito da mulher abortar porque consideram que isso é uma violência contra o feto. Ao fazer isso, estão invertendo a ordem de prioridades: colocam um não-nascido como tendo prevalência sobre uma pessoa viva, como se a mulher tivesse menos direitos que ele. Temos aí uma hierarquia onde a mulher tem menos direitos, estando relegada à terceira classe: o homem tem prioridade em tudo, estando na primeira classe; o feto (que ainda não nasceu!), na segunda; a mulher, na terceira.

Essa é uma visão recente, como pode ser lido neste artigo sobre Igreja e aborto e neste post sobre o aborto na história. Até meados do século XIX aborto era questão íntima, que dizia respeito somente a gestantes e parteiras. É importante notar que o século XIX foi tanto o século da glorificação da maternidade quanto o início dos movimentos feministas, o que resultou na seguinte situação: à medida que as mulheres passaram a exigir participação na política e aquisição de direitos, o aborto se tornou uma questão de controle das mulheres, recebendo das autoridades punição religiosa (pecado) e jurídica (crime).

Criminalizar o aborto foi uma forma de interferir na vida das mulheres, restringindo o direito ao próprio corpo e retirando delas o poder de decidir sobre a própria vida. Lutamos hoje para que este direito seja restabelecido.

Descriminalizar é necessário. A descriminalização acabará com as clínicas clandestinas de aborto, sem higiene, e responsável por uma larga percentagem de mortalidade materna, especialmente entre mulheres pobres. Acabará com o tráfico de remédios abortivos, inclusive com os remédios falsos vendidos a peso de ouro como se fossem verdadeiros. Acabará com a aberração que é punir criminalmente uma mulher porque ela ousou decidir que não quer ser mãe em determinado momento de sua vida.

É necessário também legalizar o aborto. Isso significa que o Estado deve proporcionar condições para que a interrupção voluntária da gravidez seja um procedimento médico a ser realizado na rede pública de saúde, sem que a mulher sofra julgamentos ou sanções por ter escolhido interromper a gravidez. A mulher que escolhe abortar não deve ser tratada como culpada, nem como inferior ao feto, e muito menos pode ser maltratada por profissionais de saúde. Legalizar o aborto proporcionará atendimento digno para as mulheres, concedendo-lhes direitos plenos sobre o próprio corpo.

Observação: este post faz parte da blogagem coletiva pela legalização do aborto convocada pela @A_line_. Leia também os outros posts participantes.

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