Esse anúncio horrendo foi publicado pela Agência Black (de Porto Alegre) como “homenagem” pelo dia dos ginecologistas. As críticas foram tantas que a agência já tirou o anúncio do ar (a imagem acima é um print feito pelo Edgar Demutti) e agora tem de lidar com a repercussão negativa. Infelizmente, vi várias pessoas rindo e achando que é uma brincadeira, que é papo de buteco. Não é.

Existe um mito de que mulher é linda e que tem de ser admirada. Só que mulher não é enfeite, tipo um vaso ou um quadro cuja única função é ser admirado. Mulheres são seres humanos, e suas vidas são bem mais complexas do que a de um enfeite. Mulheres não precisam ser admiradas a todo momento, e não faz o menor sentido serem admiradas quando estão em uma consulta médica para cuidar da saúde. Mulheres têm o direito de escolher se e quando querem ser tocadas, inclusive de forma sexual – e certamente não vão querer que a consulta médica se transforme em uma sessão não consentida de atos sexuais, como é o subtexto desse tipo de “homenagem” ou “piada”.

A inveja dos publicitários não é por ginecologistas trabalharem cuidando das partes íntimas femininas, mas por terem a oportunidade de extrapolarem a atividade médica para realizarem práticas sexuais não consentidas sem serem punidos e ainda serem pagos pra fazer isso.

Existem profissionais sérios na área de saúde. Só que há também muitos e muitos casos de assédio nas consultas e exames. Roger Abdelmassih é o mais famoso, e só ficou famoso porque suas vítimas foram muitas, e em sua maioria, ricas. Muitas mulheres têm medo de voltar ao médico por causa do comportamento inadequado dele, e têm medo de reclamar e serem mais maltratadas do que já foram. Descuidar da saúde acaba sendo melhor para elas do que continuar sofrendo nas consultas e exames.

Não ajuda nada que na foto da “homenagem” tenha colocado uma adolescente, jogando com o fetiche da estudante e reforçando uma mensagem que se aproveita da pouca experiência sexual para incentivar ato sexual não consentido.

Não importa o quanto algumas pessoas gostem de mulheres no sentido afetivo e sexual, isso não dá a essas pessoas o direito de achar que mulher está na frente delas apenas para ser admirada ou assediada, deixando a discussão sobre saúde e sobre seu consentimento em segundo (ou último) plano.

E a quem achou interessante a ideia de inveja, um aviso: perceba que você incorporou automaticamente o papel do agressor, do médico sem ética que aproveita a consulta para violar o corpo e a vontade da paciente. Por favor, exercite a empatia, coloque-se no lugar da paciente e pense se realmente gostaria de ser alvo desse tipo de “homenagem” abusiva.