Certa mentalidade patricarcal, antiga e preconceituosa, atribui às mulheres valores que são considerados inferiores e, por vezes, desprezíveis ou supérfluos. Assim, as mulheres são consideradas frágeis, sem racionalidade, têm por função embelezar o ambiente, precisam de um homem para defendê-las, etc. Nesses assuntos espinhosos, o campeão de preconceitos está no mito da beleza feminina: a mulher tem de ser bonita para ter a competência profissional avaliada, a mulher tem de gostar de elogios à sua beleza mesmo que fujam do assunto discutido, mulheres feiam são mais competentes porque não conseguem arrumar marido-provedor, e por aí segue o festival de bobagens.

Você, pessoa moderna e esperta que não quer magoar ou ofender as mulheres, pode aprender a neutralizar a educação machista recebida, e tratar as mulheres como iguais a você. Pra te ajudar, elaborei um pequeno guia com algumas soluções para as gafes mais comuns em torno da aparência feminina:

Em ambiente profissional, a beleza não importa
Estamos em um ambiente onde a competência é mais importante que a beleza. Portanto, qualquer elogio relacionado à juventude, beleza e aparência das pessoas pode soar equivocado, especialmente quando vem de superiores, como chefes e avaliadores. Em muitos países, é ofensivo desviar o assunto para elogiar a aparência feminina. No Brasil, essa postura de elogiar a mulher bonita e, oh, que coincidência!, excelente profisssional, ainda é muito comum. As que reclamam dos elogios à beleza quando o assunto é estritamente profissional são chamadas de ingratas, pois receberam um elogio e o recusaram. Mas o foco não é o trabalho? Se estão elogiando a aparência, significa que a competência profissional não existe, ou não merece destaque! Para evitar ofensas desnecessárias, entenda: no ambiente profissional, só discuta e elogie o desempenho profissional.

Não comece uma palestra ou apresentação elogiando a beleza das mulheres presentes
Mulher não é enfeite. É um ser pensante igual a você, que saiu de casa interessada em aprender alguma coisa com a sua palestra, e não para enfeitar um auditório. Se você começa elogiando a beleza das mulheres, está insinuando que pouco lhe importa se elas não prestarem atenção no que você diz (já que elas terão cumprido a função de embelezar o local), pois seu foco são os homens presentes.

Quer começar bem a sua apresentação? Diga “Boa noite a todAs e a todOs vocês”. Tem gente que vai dizer “mas em português o plural é no masculino”. E eu respondo: a língua portuguesa tem o foco no masculino, pois é de uma época em que mulher não tinha vida pública, mas isso não impede que modifiquemos algumas coisas para que a linguagem se torne mais adequada aos dias atuais. Sempre tive a impressão de que as aulas, livros e palestras eram apenas para os homens, pelo tanto de “vejam os senhores que…”, e mais tarde percebi que não sou só eu que fico chateada com esse tratamento.

Portanto, se você quer fazer uma apresentação que agrade também às mulheres, lembre-se que elas são parte da audiência, e ficarão mais felizes em serem incluídas no seu discurso como seres pensantes do que ouvirem um patético e repelente comentário sobre a “beleza inspiradora” da platéia. Além do mais, se você é uma pessoa séria, sua palestra já está preparada, e a tal beleza inspiradora é completamente desnecessária…

Não faça críticas focadas na juventude ou beleza da autora
Muitos homens preferem desqualificar o trabalho feminino criticando a aparência da autora. Ao invés de fazer isso, deveriam discutir o mérito do trabalho, pouco importando se foi escrito por uma mulher bonita, uma mulher feia, um ogro, um homem ou um extra-terrestre. Mesmo começar a crítica falando da juventude e beleza da autora é um erro, pois soa ofensivo (mulheres jovens e/ou bonitas não conseguem fazer um bom trabalho) e preconceituoso (é um trabalho menor, pois foi realizado por uma pessoa imatura – esse item vale para homens jovens também). Não custa repetir: a crítica tem de ser feita ao trabalho, não à aparência da autora.

Não relacione beleza e estado civil das mulheres
Novamente, um problema da língua portuguesa aplicado aos relacionamentos profissionais. Não chame as mulheres de senhorita, seja por considerá-las jovens demais, seja para sondar o estado civil delas. Esse tipo de comentário costuma ser seguido por alguma piada de mau gosto, do tipo “tão bonita, e ainda não casou?”, ou “tão bonita, e já casada?” (ou, pelas costas, “tão feia, e casada?”, ou “feia desse jeito, só pode ser competente e solteira”). Além de levar a conversa a lugar nenhum, faz parecer que o respeito às mulheres decorre do estado civil, ou que aparência, competência e estado civil estão interligados. Se ela quiser que você saiba o estado civil, ela lhe dirá. Caso não o faça, significa que o assunto é irrelevante para a discussão. O tratamento adequado? Você, ou senhora, sempre.